05 setembro 2008

João Pereira Coutinho, Avenida Paulista, Quasi Edições




       As crónicas de João Pereira Coutinho (cronista do semanário Expresso e da Folha de São Paulo) despertam inquietações várias à esquerda (sobretudo) e à direita, por vezes motivadas por antipatia automática e visceral com a personagem que acaba por impedir uma discussão mais clara sobre o conteúdo dos escritos. Claro, há motivos de sobra para embirrações em todos os quadrantes, seja pela veia conservadora, assumida e apregoada, seja pela recusa de valores tão caros a alguns conservadorismos. Mas há sobretudo matéria suficiente para reflectir, muito para além das opiniões de cariz político ou do imediatismo da actualidade noticiosa. Aliás, é quando se afasta dos temas da agenda política que JPC concretiza com maior sucesso o seu próprio programa de escrita, que assume a crónica como um género literário, e dos mais nobres. Não porque os textos sobre a actualidade sofram de alguma mácula na escrita, mas porque neles são mais visíveis a análise e o comentário do que a reflexão sobre a natureza humana e a deambulação pelas leituras, vícios, prazeres e observações de que se alimenta a prosa culta do autor.
       Mas o que importa reter nesta antologia é, afinal, aquilo que perdurará para além de polémicas efémeras: estilo, elegância e uma forte marca autoral. JPC escreve com esmerada dedicação à forma, erguendo raciocínios por vezes inesperados, alimentando uma personagem que esbanja charme e flanerie e prestando frequentes homenagens aos cronistas cuja influência se reconhece de modo sincero na sua escrita, como Auberon Waugh, Paulo Francis ou Jeffrey Bernard. As crónicas de Avenida Paulista, publicadas na Folha de São Paulo entre 2005 e 2008, podem versar sobre os píncaros da fruição estética, sobre temas políticos actuais ou sobre quotidianos e banalidades várias, mas não se encontrará uma linha deslocada, uma palavra prescindível ou qualquer descuido relativamente à elegância com que se podem alinhar frases num texto. E isso não é dizer pouco quando se fala da imprensa actual.

Sara Figueiredo Costa
(Texto publicado na revista Time Out nº45, 5 Agosto 2008 )

Sem comentários: