03 novembro 2008

Mudança de Casa

O blogger não me deixa publicar novos posts, mas parece que deixa editar os antigos. Assim sendo, caso algum leitor incauto passe por aqui e pense que abandonei o Cadeirão Voltaire, saiba que me mudei para aqui. Mudem também o endereço nos vossos links, por favor. Obrigada!


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365

O novo número da 365 já está nas bancas.



Com textos de António Martinho, Cláudia Matos Silva, Elisabete Patrícia Andrade, José Eduardo Agualusa, José Luís Peixoto, Luís Graça, Luísa Cardita, Mário Bruno Pastor, Mia Couto, Miguel Marques, Pedro Martins, Pedro Santo, Rui Manuel Amaral, Rui Lage e valter hugo mãe.

Ilustrações e fotografias de Agan Harahap, Alex Gozblau, Ângela Berlinde, Catarina Limão, Gonçalo Franco, Leonor Inverno, Micael Póvoa e Rita Lino.

Design de Alex Gozblau.

Da Galiza IV

OPERA

o ter vivido queda da explosión como un aroma.
Salta a risa e multiplícase por todo o corpo
cubríndonos de estrelas espantadas polo touro
minguante que se achega co segredo da morte.
Desunimos as mans ocupadas en perdernos.
Xa somos a distancia que non nos necesita
porque sabemos a flor que nos mira desde o olvido

Luisa Villalta, in Rota ao interior do ollo, 1995

02 novembro 2008

Leituras II

O hábito de guardar recortes de jornal, e jornais inteiros, por vezes, revela-se muito prejudicial ao espaço que nos rodeia. A ilusão de que vamos disciplinar-nos e recolher com regularidade os artigos que queremos guardar, despachando o resto para a reciclagem, é sempre derrotada pela falta de tempo e de paciência. Mas o reencontro com artigos que quisémos preservar para memória futura é quase sempre compensador. E de certeza que a crónica de Alexandra Lucas Coelho no Ípsilon desda sexta-feira será um reencontro feliz daqui a muito ou pouco tempo, por entre os destroços de imprensa que ocupam o caixote mesmo ao lado deste cadeirão. Pelo sim, pelo não, guardei a versão digital, que aqui partilho como uma espécie de dádiva (para mim foi isso mesmo, uma dádiva).

Viagens com bolso

Alexandra Lucas Coelho


O inglês E. M. Forster chegou a Alexandria durante a I Guerra Mundial. Como era objector de consciência, foi trabalhar com a Cruz Vermelha nos hospitais. Podemos imaginar o que viu.
Durante essa estadia, Forster teve dois encontros decisivos: com o poeta Konstandinos Kavafis, de quem se tornou firme admirador, e com o jovem condutor de eléctricos Mohammed el-Adl, por quem se apaixonou.
Kavafis era - como lhe chamou depois Durrell no "Quarteto de Alexandria" - o "poeta da cidade". Isso queria dizer que era o poeta da antiguidade, 2300 anos debaixo dos pés, e através da antiguidade é que via o presente, como se os corpos quentes de agora fossem a nunca saciada possibilidade de possuir os corpos frios das estátuas.
Quanto a Mohammed El-Adl, tinha 17 anos quando conheceu Forster e morreu com tuberculose pouco depois da guerra.
Para Forster, Alexandria tornou-se uma cidade íntima, daquelas que doem como uma falta quando nos lembramos. Entre o passado que não viveu e o presente em que inventa o passado, um dos seus livros "alexandrinos" é "Pharos e Pharillon".
É difícil, improvável mesmo, encontrar a tradução portuguesa nas livrarias. Não porque esteja esgotada - tirou 1000 exemplares. Não porque seja muito antiga - saiu em 1992. Mas porque vendeu pouco e as livrarias não têm tempo nem espaço. Quem não vende, salta, é devolvido, re-armazenado, descatalogado. Na melhor das hipóteses será revendido numa feira pelo preço de um prego ao balcão. Na pior das hipóteses acaba na guilhotina, tão literalmente como Maria Antonieta. E acontece aos melhores no "mercado do livro".
No "mercado do livro", os livros rápidos ficam à vista porque são rápidos - e mais rápidos são por estarem à vista. Os livros lentos saem da vista porque são lentos - e mais lentos são por não estarem à vista. Ruído e relevo, eis tudo.
Quando a Cotovia começou a publicar, há 20 anos, tudo parecia já gritante, mas afinal não. Agora sabemos como se pode ficar cego e surdo a atravessar uma livraria.
No meio de tudo isto, ou mesmo numa estante de casa, os livros da Cotovia acham-se onde o olhar descansa, com uma pequena cotovia aos pés. São livros opacos, silenciosos, todos voltados para dentro.
Foi o que confirmei nas minhas estantes, em busca daqueles livros da Cotovia que me puseram a caminho, depois de me terem feito parar. Não vou fazer uma lista. Havia sobrecapas de papel vegetal escurecidas pelo sol e capas de duas cores clareadas pelo sol. Lá dentro, misteriosos sublinhados a lápis e, horror, pelo menos um a caneta - este "Pharos & Pharillon", que desde que foi comprado viajou duas vezes a Alexandria, uma de empréstimo, a outra comigo.
Na grande baía que já foi helénica, ptolomeica, romana, cristã, judia, grega, italiana, alemã, francesa e agora é muçulmana com subúrbios de milhões, já não encontrei fazedores de algodão, mas vi com Forster os flocos voarem sobre a cidade como uma tempestade de neve. Os livros ampliam infinitamente a realidade.
"Pharos & Pharillon" faz parte do catálogo morto da Cotovia. A falta de atenção mata, e é toda nossa. Há dias, quando fui ver o catálogo vivo, descobri tudo aquilo que não sabia sequer que saíra, dedicada e silenciosamente. Para o que mais importa, os próximos 20 anos, aproveitem.

Leituras

O Guardian publica um conto de Lorrie Moore (autora do belíssimo Pássaros da América, editado em português pela Relógio d'Água), intitulado "Foes". Para ler aqui.